CONSIDERAÇÕES
FINAIS
A
concepção conservadora da História [...] é a defesa intransigente das classes
dominantes e a exaltação dos grandes estadistas [...] a concepção conservadora
ensina o conformismo e diz sempre amém aos poderosos [...] a história
conservadora do Brasil é sempre a história dos vencedores.
(RODRIGUES,
1988, p. 1, 5 e 6).
A memória histórica constitui uma das
formas mais poderosas e sutis da dominação e da legitimação do poder.
(Dilma Paula, In:
FENELON, 2004, p. 43 e 144)
Espero que o leitor tenha compreendido o porquê da versão epopeica da
história do Acre ter prevalecido. Ela não se tornou hegemônica por acaso. Como
foi mostrado, a história “espetáculo” serviu para promover as causas de grupos
de interesse e foi fundamental para despertar lapsos de
sentimentos de ufanismo, otimismo e alienação coletiva nos acrianos.
A utilização política do passado e a manipulação da história foram
comuns no Acre. A riqueza de exemplos e a quantidade de material acumulada
durante a pesquisa nos forçou, por questão de espaço, limitar a análise a dois
casos específicos, quais sejam, o do Movimento Autonomista e o do governo da
Frente Popular. A escolha dos dois não foi aleatória, acreditamos que ambos foram
modelares na criação de “mitos políticos”, pois conseguiram transformar os seus
interesses particulares em causas populares.
Como já foi visto, o “mito político”, segundo
Cassirer (2003), é uma técnica de alienação coletiva provocada
pela invenção e repetição de discursos históricos, culturais e publicitários que manipulam a opinião pública em favor de propósitos
político-partidários. O Movimento dos Autonomistas e a Frente Popular do Acre também
mobilizaram “mitos políticos”, aqui chamados, no caso mais recente, de política
simbólica.
No Acre, com o
passar do tempo, as manipulações da história foram aumentando em quantidade e
em qualidade. No caso da Frente Popular, como foi visto, elaborou-se uma narrativa
histórica cuja a saga acriana culminasse na ascensão do PT ao governo do Estado em
1999. Dessa forma, a vitória eleitoral do PT assumiu um significado similar a
dos “grandes eventos” do passado acriano.
Através dos
exemplos dados nesse livro foi possível constatar como o poder simbólico da
linguagem é empregado para construir e conservar “verdades” supostamente
históricas. Ao fazemos uma análise apurada de algumas das afirmações feitas
pela historiografia oficial, constatamos que sua força de evidência não passa
de um efeito de sentido inventado para sustentar os interesses do establishment
acriano. Nossas autoridades precisam entender que o povo acriano não necessita de
epopeia, muito menos de heróis, o que ele carece é de uma educação de
qualidade, compromissada com uma conscientização política emancipatória do cidadão.
Nunca devemos
esquecer que a mesma narrativa epopeica que embelezou os
acontecimentos inaugurais do Acre, foi a mesma que converteu a história desses
acontecimentos em um mito fundador. O ufanismo
acriano é produto de uma certa memória do passado e não exatamente da história
desse passado. A “memória do vencedor”, como já foi
dito, é sempre de autopromoção. Ela imortaliza a versão desejada dos fatos
e não os fatos propriamente ditos. É aquilo que Ricouer (2007, p. 98) chama de
“ideologização da memória”, ou seja, é o abuso da memória (Cf. RICOEUR, 2011,
p. 73).
Termino dizendo que é melhor aproximar a
história da verdade e ter uma sociedade mais lúcida e consciente dos seus erros
e limites; do que aproximar a história da mentira e produzir uma sociedade
surtada que não sabe distinguir o fato da ficção. É por isso que defendo um
ensino mais sincero da história do Acre, pois prefiro provocar feridas
narcisistas no “eu” acriano e ter dele uma imagem mais próxima do real, do que tomar
um “doping” de acrEanismo todas as vezes que desejar sentir orgulho de um “eu”
acriano que não existe. E você estimado leitor, o que prefere?
MUITO OBRIGADO PELA LEITURA!!!!
Rio Branco, fevereiro de 2017.